Lembro da primeira vez que ouvir um profissional contábil falando sobre a necessidade de constante atualização na área, de não ser apenas um contador que gera guias e toda essa crítica repetida sempre quando o assunto é o futuro da contabilidade. Ouvir isso no primeiro dia, na primeira aula, dita pelo primeiro professor que entrou na sala do último andar da Faculdade onde cursei minha graduação. Lembro também que no dia da formatura um discurso muito parecido foi feito. Isso mesmo, em quatro anos estudando, o fantasma do fim da profissão versus a atualização permanente foi usado convenientemente por todos os professores, palestrantes, convidados sempre que era entregue um microfone e se viam diante de futuros contadores. Hoje, após quatro anos que finalizei a graduação e oito anos depois da primeira vez que ouvi essa “preocupação”, se faço uma pesquisa no Google sobre o futuro contábil os apontamentos são exatamente os mesmos.
Acontece que de lá para cá a STARTUP pioneiro na área de serviços financeiros, a Nu Bank começou suas atividades, a campanha de valorização da classe contábil “2013: ano da contabilidade no Brasil” foi lançada oficialmente no dia 18 de março. Nesse ano ainda teve tempo para a Gretchen casar-se com seu atual marido. No ano seguinte o Orkut deixou de existir. Também em 2014 empresa como Spotify chega ao Brasil e muda a maneira como consumimos conteúdo dos nossos ídolos. O Facebook comprou o WhatsApp, juntando o pior de dois mundos por cerca de US$ 22 bilhões. A economia compartilhada e colaborativa não é apenas realidade como entram na pauta dos governos em busca de regulamentação. Em 2015, o mundo passava por uma nova crise financeira e o Brasil teve a economia contraída em cerca de 3,5%. Na lista da Forbes de 2016 o homem mais rico do mundo era o fundador da Microsoft, BILL GATES, dono de um patrimônio de US$ 75 bilhões. A fortuna de Jeff Bezos era míseros US$ 45,2 bilhões. Twelves, macaco de Latino sumiu em 2017, ainda nesse ano o Bitcoins atingiu seu máximo histórico em 17 de dezembro. Twelves morreu em 2018. A Amazon ultrapassou a Apple e tornou-se a marca mais valiosa do mundo em 2019. Por esses e outros tantos motivos não posso acreditar que tudo isso tenha acontecido nos últimos anos e o discurso sobre a profissão contábil esteja ainda sendo levado para a vala do lugar comum.
Círculo Viciosos
Vagando no tempo e espaço o futuro da contabilidade parece andar em círculo viciosos entre ter que evoluir, mas não é reconhecido e por isso não evolui. Se por um lado o contador quer oferecer um serviço mais colaborativo na gestão do negócio de seu cliente para ser mais valorizado enquanto gerenciador de informações por outro lado os clientes dificultam a geração de dados não enviando todos os documentos por achar que não é prioridade já que o contador só fecha balanço e gera guia. Os dois lados saem perdendo. O contador não consegue desempenhar na plenitude suas habilidades e o empresário não consegue valorizar o trabalho do profissional e sem saber pode perder chance de melhorar tomada de decisão de sua empresa.
Troque as filas por objetivos
Talvez você conheça o economista Albert Hirschman e seu artigo sobre a mobilidade social, nesse texto, ele escreveu um exemplo que chamou de Efeito Túnel, em um resumo genérico, é descrito a situação de alguém que está dentro de um túnel de duas faixas parado e em determinado momento a fila ao lado começa andar um pouco enquanto a outra continua parada. Isso causa esperança mesmo em quem fica parado, pois eventualmente todos serão beneficiados em algum momento. Ou seja, ao observar o que está ocorrendo para o outro, causa uma expectativa positiva em relação aos envolvidos, existe nisso uma tolerância alimentada pela esperança de que chegará a sua vez. No entanto pode gerar uma frustração em caso de só uma fila andar, isso desencadeia um processo contrário, ou seja, quem fica parado por muito tempo no mesmo lugar vendo outros andarem se sentem frustrados tendo a percepção de que estar sendo prejudicado em relação aqueles que estão na fila que andou. E o que isso tem a ver com o tema? Troque as filas por objetivos, de um lado o objetivo do contador do outro o objetivo do cliente, é obvio que os dois estão interessados em evoluir, crescer, lucrar e certamente estão dispostos a ceder a vez ao perceber que é mais importante que o outro cresça primeiro, pois desta forma, assim como no exemplo, vai gerar uma sensação de crescimento futuro, planta agora para colher depois.
Ocorre que nesse processo a relação pode se desgastar, as expectativas não são supridas e por mais que os objetivos continuem sendo os mesmos um lado pode sentir-se prejudicado. Toda vez que o cliente deixa de enviar o documento é como se a fila do cliente estivesse andando e a outra seguindo parada. Sempre que o cliente recebe apenas uma guia ou um balancete anualmente é como se somente a fila do contador andasse. Os dois ficam frustrados, os dois acreditam merecer mais. Os dois estão simultaneamente parados no túnel. E os alunos de contabilidade continuaram a ouvir o mesmo discurso em todas as palestras…
Particularmente, das mudanças que ocorreram nos últimos oito anos a que mais chamou minha atenção está relacionada ao macaco do Latino, contudo é preciso ficar atento às evoluções nos meios digitais que são frequentes, a maneira com que as pessoas se comunicam não é mais a mesma. Se antes já era difícil vender o serviço contábil hoje é preciso pensar nisso em uma linguagem digital. Contudo, achar que esse é o segredo sagrado do sucesso é preguiçoso, inclusive pelas variáveis envolvidas nos algoritmos da internet. Pensar em tecnologia nesse caso está mais relacionado a otimizar os processos das rotinas contábeis com utilizações de programas capazes de agilizar lançamentos possibilitando direcionar um tempo maior para analisar os fatos. Conectar com o cliente é também entender que nem todo mundo precisa de 15 indicadores, admitir que às vezes um fluxo de caixa é suficiente para um tipo de empresário. Pode ser a melhor escolha.
Quando o Warren Buffet em uma entrevista disse que “Contabilidade é a linguagem dos negócios” certamente ele percebe que de forma ampla a contabilidade não mente, independentemente se for para um Microempresário, um gerente ou um investidor a melhor maneira que eles possuem para conhecer uma empresa é com análise de seus números, independentemente do contexto econômico e só um contador é capaz de fazer isso. No fim é como diz a musica de final de ano “O futuro já começou”, tratá-lo como algo que ainda está por vir é não enxergar as oportunidades do presente.
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*Por Tatiana Martins – formação em Ciências Contábeis – com pós-graduação em administração financeira e pós-graduando em ciências de dados. Escrever sobre o mundo contábil e financeiro é uma das suas paixões. “Duas coisas só me deu o Destino: uns livros de contabilidade e o dom de sonhar.”
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