Para quê rapidez do pix num país tão atrasado
Nos últimos dias, fiquei presa nas caixas de comentários de notícias relacionadas ao Pix, essa nova e surpreendente maneira de executar pagamentos. Das coisas mais absurdas que li, os meus preferidos são relacionados às teorias de implantação de chips e, assim como calça boca de sino, a volta do sequestro relâmpago, já que a facilidade de a vítima sozinha poder pagar o seu próprio resgate e o valor já ser debitado na conta do seu algoz em dez segundos poderia fomentar novamente esse nicho de mercado esquecido em meados dos anos 2000. Tudo isso por meio de um simples cadastramento de uma chave que, segundo minhas pesquisas das caixas de comentários, servirá ainda para que o governo, ou alienígena, ou o grupo Katinguelê roube dados dos cidadãos e os obrigue a declarar o Imposto de Renda ainda na primeira semana de Março e não no último dia para encerar o prazo. Essa sem dúvida foi a teoria mais assustadora que li EM TODA A MINHA VIDA.
A verdade é que não precisa ter uma formatura em área exata ou mesmo grande conhecimento em economia para entender que esse novo serviço ofertado pelos bancos é bastante vantajoso, ao menos para os clientes. É aqui onde surgem algumas questões.
Nós brasileiros estamos acostumados a esperar, estamos acostumados a pagar sempre o maior valor, estamos acostumados a ir em três guichês e ninguém resolver nossos problemas, estamos acostumados a pegar filas e após trinta minutos ser avisado que a “Dona Marli” está em horário de almoço e só retorna às 14 horas. (Tatiana Martins)
Por isso quando recebemos vantagens somos programados a desconfiar. É o natural de qualquer brasileiro que já tenha ido em um cartório numa terça-feira.
Acontece que o Pix é realmente apenas mais um item na cesta de serviço oferecido pelo seu banco de forma gratuita e visando agilizar as operações de pagamentos. Caminhamos mais alguns passos rumo a modernidade e se um dia achamos estranho o funcionamento do Wi-Fi, arrisco em dizer que daqui alguns anos teremos comentários do tipo “E sua mãe que pagava 10 reais para transferir dinheiro”.
O presidente do Banco Central avaliou que o cadastramento de 30 milhões de chaves Pix em três dias foi “uma grande surpresa”. “Conversando com pessoas que estudam isso há mais tempo, a gente não vê esse volume de adesão em nenhuma plataforma eletrônica. Não teve isso nem no Instagram, nem no Facebook, nada parecido”, disse. Ou seja, o jovem místico não pode ver um cadastro na Internet que já quer fazer sem sequer ler o contrato. Brincadeiras à parte, a verdade é que isso meramente reflete um comportamento cada vez mais presente nas gerações que cresceram inseridas nesse mundo globalizado, onde sempre foi normalizado excetuar ações de forma rápida, pratica e sem muito conhecimento técnico de como tudo isso funciona por trás dos algoritmos. O fato é que estamos cada vez mais acostumados com operações eletrônicas e gratuitas; o Pix veio como uma resposta tardia, mas veio.
O cadastro é feito de forma intuitiva dentro da plataforma do aplicativo bancário. É possível cadastrar até cinco chaves em cada banco. Isso significa que caso você tenha contas nos bancos A e B poderá ter até dez chaves. Obviamente, elas não poderão ser repetidas, por exemplo, no banco A se cadastrar o CPF não poderá repetir o cadastramento do mesmo CPF no banco B, então a opção é cadastrar um e-mail ou telefone. Mas é importante entender que cada chave é um código de identificação diferente e por isso não podem ser repetidas.
Diferentes dos antiquados TED e Docs. o Pix não cobrará tarifas de pessoas físicas, e pessoas jurídicas poderão usar esse serviço com custos mais baixos dos que os já aplicados pelos bancos. Você deve estar se remoendo querendo saber qual interesse escuso do banco em oferecer esse serviço. Bem, vejamos, lembra de quando para usar Facebook e Zapzop no celular, tínhamos que consumir dados de Internet? Pois bem, hoje em dia não existe uma operadora de plano de celular que não inclua esse tipo de serviço como benefício grátis. Assim como todas as operadoras tiveram que entrar numa corrida desesperada para manter seus clientes, os bancos agora, pela primeira vez, estão percebendo que quando oferecem vantagens aos seus clientes é possível também ter ganhos. O custo dessa operação sairá mais barato para os bancos, por isso eles estão disputando cliente por cliente nessa largada. Voltemos ao exemplo do plano de celular. Quem aderiu a empresa A por oferecer um pacote ilimitado de Internet para usar o Facebook está nela até hoje. É chato ficar trocando de lá para cá e os bancos sabem disso. Quem conseguir convencer o cliente a emitir uma chave de acesso agora, certamente terá um cliente por longos anos, assim, poderá ter sempre alguém por perto para tentar vender outro tipo de serviço mais caro.
Claro que ocorrerão erros em algumas operações, pois se trata de algo novo e os bancos estão ainda na fase de adaptação. Inclusive já há relatos de pessoas que fizeram transferência usando o Pix e o valor não caiu na conta destinada. Como cada instituição financeira vai lidar com suas próprias falhas vai dizer muito sobre qual o local ela estará nesse novo cenário digital que precisa de agilidade, eficiência e muita praticidade.
E se você ainda acredita nessas teorias absurdas sobre o Pix do tipo “O governo vai saber até se eu compro uma bala”, olha só jovem, se você compra bala usando suas contas bancárias, o governo já sabe. Então qual o problema? Que tipo de bala é essa que você anda comprando? Talvez não esteja pronto para essa conversa, mas a única coisa que te diferencia das tias doidas do Zap é que ao menos elas sabem como molhar cada plantinha.
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*Por Tatiana Martins – formação em Ciências Contábeis – com pós-graduação em administração financeira e pós-graduando em ciências de dados. Escrever sobre o mundo contábil e financeiro é uma das suas paixões. “Duas coisas só me deu o Destino: uns livros de contabilidade e o dom de sonhar.”
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